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Dossiê: De bem com a vida - O poder do riso
A capacidade de achar graça tem sido estudada seriamente nos últimos anos. A gelotologia mostra o que está por trás de uma boa gargalhada
por Ulrich Kraft


Quando ouvimos uma boa piada, daquelas que nos fazem que nos fazem desatar a rir, nossa boca produz uma série de sons vocálicos, cada um com duração de 1/16 de segundo, repetindo-se a cada 1/5 de segundo. O diafragma sacode, o coração bate mais rápido, a pressão arterial sobe e as pupilas se dilatam. Enquanto emitimos esses sons, o ar sai de nossos pulmões a mais de 100 km/h, antes que, passados cerca de dois segundos, a operação se repita. E quem quer que esteja ouvindo essa barulheira, muito provavelmente vai ficar curioso e querer saber o que está perdendo.

Adultos riem 20 vezes por dia, em média. Crianças, até dez vezes mais. Rir é componente tão sólido da existência humana que esquecemos como são curiosos esses acessos de alegria. Por que rimos quando alguém conta uma piada ou nos toca de leve a sola dos pés? O sr. Spock, por exemplo, tripulante da nave Enterprise na série Jornada nas estrelas, não entendia as risadinhas dos terráqueos: “Humor? É um conceito estranho. Não tem lógica”, dizia. O escritor húngaro Arthur Köstler (1905-1983) caracterizava o riso como um reflexo de luxo, sem nenhuma utilidade biológica.

De modo geral, porém, a Natureza não faz investimentos insensatos e costuma livrar-se de características inúteis. Portanto, o ímpeto de rir deve ter contribuído para a sobrevivência no decorrer da evolução, ou nossas gargalhadas teriam tido o mesmo destino dos dinossauros. Filósofos da Antigüidade formularam teorias sobre a natureza do humor, mas, na ciência, o fenômeno permaneceu obscuro por muito tempo.

Atualmente há muitos estudos sobre características humanas elementares, tais como a capacidade de sentir medo, mas a pesquisa sobre o riso – a gelotologia – pouco a pouco ganha espaço. As tecnologias de imageamento cerebral permitem que neurologistas observem como diferentes regiões do cérebro reagem às piadas. Os resultados mostram que humor é coisa séria, demanda certas capacidades mentais e desempenha papel central na vida em sociedade. Muitos gelotologistas chegam a considerar o riso a mais antiga forma de comunicação.

Ulrich Kraft é médico e jornalista científico.
Fonte: Viver Mente&Cérebro



A simbologia do som
Pesquisadores buscam entender por que tendemos a achar que certas palavras “combinam” com objetos; a resposta pode estar na sinestesia
              Durante muito tempo linguistas acreditaram que as palavras eram apenas coleções de sons – uma representação acústica que, em geral, tem pouco a ver com o seu significado concreto. No entanto, estudos recentes desafiam essa ideia: muitos sons parecem suscitar imagens em nossa mente, o que faz estudiosos acreditarem que, muitas vezes, associamos certos estímulos auditivos a percepções sensoriais. Seria o que o pesquisador Kita Sotaro, da Universidade de Birmingham, Reino Unido, chama de “simbolismo dos sons”. Ele acredita que alguns vocábulos evocam a ideia de beleza e maciez, por exemplo, enquanto outros despertam a ideia de aparência espinhosa, de gosto amargo ou de rapidez.                  

               Em todos esses casos, a “forma” do som está ligada aos nossos sentidos. No século passado, um estudo realizado psicólogo alemão Wolfgang Kohler tornou-se clássico: ele apresentou a várias pessoas desenhos de duas formas sem sentido – uma, porém, tinha formas pontiagudas, e outra, linhas curvas – e pediu a voluntários que nomeassem as imagens de “takete” ou “baluba”. A maioria escolheu a primeira palavra para a forma “espetada” e a segunda para a curvilínea. O resultado sugere que alguns vocábulos “combinam” com aquilo que descrevem. A tese da existência de um simbolismo sonoro foi reforçada em uma série de estudos com crianças realizados por Susan Parault, então da Universidade de Maryland em College Park. Os neurocientistas Vilayanur S. Ramachandran e Edward Hubbard, ambos da Universidade da Califórnia, acreditam que a sinestesia (uma condição na qual as pessoas “misturam” estímulos sensoriais, como sons e imagens, tendo a impressão, por exemplo, de que certas palavras estão vinculadas a cores) pode ajudar a explicar por que muitos vocábulos se parecem (ou não) com aquilo que designam.


 

 

Coletivo cérebro

 


Publicado em 01/07/2011
O neurocientista Miguel Nicolelis lança novo livro. Além de falar sobre a interface cérebro-máquina, questão que estuda há mais de dez anos, cientista apresenta analogia entre o comportamento dos neurônios e a vida em sociedade.
No final da palestra de lançamento do novo livro do neurocientista Miguel Nicolelis no Planetário do Rio de Janeiro, na terça-feira (28/06), um senhor da plateia atravessa o mediador e – voz firme – lê um papel com uma pergunta previamente escrita:
"Você poderia dizer se existe uma consciência extracorpórea do eu, alguma coisa que explica a autoconsciência humana? Porque, se formos pensar, para provar a nossa existência teríamos que estar olhando para nós mesmos, pois o observado só existe com o olhar do observador."
Nicolelis, sem pausa para reflexão, responde com humor: "Meu Deus, o Rio de Janeiro é complicado".
Coletivo cérebro
Explica-se: antes da pergunta derradeira, outros questionamentos filosóficos já haviam sido feitos ao cientista, que tinha acabado de apresentar em palestra de quase duas horas as ideias do seu recém-lançado livroMuito além do nosso eu – obra que explica como, após 12 anos de pesquisa, a ambição teórica de entender a interface cérebro-máquina tornou-se experimento prático com data mais ou menos programada para ser posto à prova com humanos.
Sobre Nicolelis, muitos já sabem: tem 50 anos, é cogitado a todo momento ao Nobel de Medicina e, portanto, tido como um dos cientistas mais importantes do mundo. Sua pesquisa centra-se na tentativa de mapear as tempestades neurais que ocorrem no cérebro e geram uma sinfonia de informação capaz de, se bem registrada e codificada, mover objetos com a 'força do pensamento'.
Daí vem o termo 'interface cérebro-máquina', alegoria para o que acontece quando uma espécie de chip é implantado no cérebro de um primata e, por meio de impulsos elétricos neurais, uma prótese mecânica se movimenta.

Veja o vídeo abaixo e entenda melhor o experimento mais conhecido de Miguel Nicolelis

A esperança, claro, é a aplicabilidade do estudo de Nicolelis em seres humanos, em especial naqueles que perderam a capacidade de movimentar alguma parte do corpo.
As experiências do cientista já foram exaustivamente debatidas e, em dezenas de entrevistas e matérias, explicadas. Agora é questão de esperar: ele, como já afirmou em algumas entrevistas, quer que um adolescente brasileiro portador de deficiência física dê o clássico pontapé inicial da Copa do Mundo de 2014, no Brasil. Seria, também, o início de um novo paradigma da neurociência e a consagração do seu projeto Walk again (Andar novamente, em português).

O livro

Por mais interessante que possa ser o conteúdo científico de Muito além do nosso eu(e, de fato, é), o que soa novo na obra não são as amplamente debatidas experiências de Nicolelis e o resumo que ele faz dos 12 anos de trabalho, e sim o paralelo que o cientista estabelece entre aquilo que pesquisa e 'as coisas do mundo'.
No livro, Nicolelis reafirma categoricamente a visão distribucionista, que diz que o cérebro funciona por meio de estímulos coletivos de uma vasta população de neurônios espalhada em diferentes regiões cerebrais. Desdiz, assim, a visão localizacionista, que acredita que as funções cerebrais são realizadas de modo especializado e por neurônios segregados, individualizados.
Coletivo cérebro
Na palestra, Nicolelis apresenta diagrama de experiência realizada com macacos que exemplifica visualmente a famosa interface cérebro-máquina. (foto: Thiago Camelo)
Não é novidade. Esse é ponto inicial da pesquisa do neurocientista. A abertura social e filosófica que advém dessa questão é a novidade: Nicolelis agora compara esse comportamento 'coletivo' do sistema neural com a competência humana de viver em grupo, rede e sociedade – o nós como extensão do eu.
Na palestra, ele afirma: "o cérebro não reconheceria apenas a prótese mecânica como extensão do eu, mas tudo ao nosso redor, as pessoas e os objetos, como partes de uma coisa só."
Em entrevista ao jornal O Estado de S Paulo, Miguel Nicolelis sugere uma hipótese ainda não provada cientificamente de que "os modelos colaborativos funcionam tão bem porque a mente os reconhece como naturais".
Na mesma entrevista, o neurocientista afirma que o cérebro é "uma grande democracia" e que, por isso, "as redes sociais são um sucesso".
Brainet: a internet em que todos estariam conectados por implantes de chipsno cérebro e pensamento
Essas ideias novas – do "cérebro coletivo", do cérebro como "modelo colaborativo", do cérebro como "rede social" –  são tão presentes no livro quanto a proposta, não tão nova assim, da interface cérebro-máquina.
A proposição abre portas para invenções aventadas mais recentemente como a brainet, a internet em que todos estariam conectados por implantes de chips no cérebro e pensamento, sem a necessidade da mediação da tela de um computador.
A proposição abre também portas para questionamentos filosóficos e existenciais mais concretos.
Voltemos ao lançamento do livro no Rio de Janeiro e ao primeiro parágrafo do texto:
O senhor da plateia está de pé e pergunta sobre a tal consciência extracorpórea do eu. O que poderia se enquadrar na categoria de lugares-comuns da filosofia e existencialismo não soa como tal diante do horizonte que a proposta de Nicolelis abraça. O neurocientista faz a piada sobre a cidade mas, logo depois, tenta, pausada e seriamente, discorrer sobre o assunto. Parece o começo de novas respostas.
FONTE : 




Obra inédita de Jung: Vozes lança O Livro vermelho
Oculto por 70 anos, livro traz ilustrações e manuscritos do autor; os textos servem de base para os trabalhos do criador da psicologia analítica

Divulgação
O barco solar
Acaba de ser lançado o tão esperado O Livro vermelho, ou Liber novus, como o chamou Carl Gustav Jung. O criador da psicologia analítica terminou a obra por volta de 1930 e na época optou por não divulgá-la devido ao seu caráter extremamente pessoal. Mesmo depois de sua morte, em 1961, a família de Jung preferiu manter o trabalho oculto. Mas agora, depois de mais de dez anos de negociações e preparo, o livro é apresentado ao público.

Todas as grandes obras da tradição ocidental compõem o universo cultural de Jung e o influenciaram de certa forma. É possível perceber grandes influências na composição de O Livro vermelho: Zaratustra, de Nietzsche, A divina comédia, de Dante, Fausto, de Goethe. Mas o Líber novus é novo e originalíssimo tanto na forma e apresentação quanto no conteúdo. Enquanto Nietzsche apregoou a morte de Deus, uma nova ética, a “transformação de todos os valores”, O Livro vermelho traz a novidade do renascimento da divindade interior, da experiência pessoal pela transcendência das instituições. Enquanto Dante realiza uma viagem interior de aprofundamento, personificando em Virgílio um guia para o mundo dos mortos, Jung tem múltiplos guias, sendo o mago Philemon – aquele que centraliza o conhecimento intuitivo – o maior de todos.

O livro começa em dezembro de 1913, quando Jung tem uma visão enquanto viajava para visitar uma parente, em uma cidade próxima a Zurique: toda a Europa coberta por um mar de sangue, com milhares de cadáveres boiando, do norte até o sul. É uma imagem terrível que se repetiu como se fosse um sonho aterrorizante. Ele relatou os detalhes em seu livro de memórias, assinalando a necessidade premente que sentiu de compreender o sentido. De início, chegou a pensar que estivesse sofrendo de uma grave crise psíquica e que a visão talvez dissesse respeito a uma doença mental iminente. Só quando pouco tempo depois a Europa mergulhou na Primeira Guerra Mundial (1914- 1918) com seus incontáveis mortos e o profundo sofrimento para milhões, ele pôde compreender o sentido antecipatório de sua visão. Ficou claro para ele que as poderosas imagens que se desenrolaram a partir daí em fluxo caudaloso em fantasias e sonhos falavam também de algo interno, uma profunda transformação interior. As mudanças interiores aconteciam paralelamente às dolorosas alterações da estrutura mundial.




Agulhas, tatuagens e neurônios
As aplicações da acupuntura em pontos específicos do corpo parecem estimular o circuito nervoso responsável pela percepção da dor, diminuindo sua intensidade.
por Sidarta Ribeiro
A inserção de agulhas em pontos específicos do corpo para fins terapêuticos é praticada há milênios. Sua origem parece ser a China, mas tatuagens em corpos mumificados encontrados na América do Sul, Sibéria e Europa Central (Moser et al. (1999) Lancet 354:1023) sugerem o uso da acupuntura por culturas pré-históricas não-chinesas. O exemplo mais famoso é Ötzi, homem preservado pelo gelo alpino por 5.200 anos, surpreendentemente marcado por tatuagens que parecem indicar, com precisão de milímetros, alguns pontos da acupuntura chinesa (Dorfer et al. (1999) Discov. Archaeol. 1:16). Entusiastas vêem nesses achados uma confirmação de que os pontos da acupuntura, distribuídos ao longo de um complexo mapa de meridianos, refletem um conhecimento ancestral objetivo sobre onde atuar no corpo para atenuar a dor. Em 1965, Melzack e Wall propuseram que a acupuntura aniquila a dor pela interferência - em "portais" neurais especializados - dos estímulos dolorosos leves com a dor patológica (Science 150: 971).

No entanto, o uso da acupuntura na prática médica ocidental enfrenta fortes resistências desde os tempos de Marco Pólo. Embora não se duvide mais da eficácia das agulhas para induzir sedação, muitos cientistas sustentam que os efeitos da acupuntura decorrem apenas da crença do paciente no potencial terapêutico do tratamento. Para os céticos, a única utilidade da acupuntura é a indução de um efeito placebo genérico, através da liberação de analgésicos endógenos como os opióides (Pomeranz & Chiu (1976) Life Sci. 19:1757). Segundo esta visão, os pontos específicos preconizados pela acupuntura chinesa seriam inúteis como saber médico, não passando de uma velha superstição associada a um bom placebo.

Esta interpretação tem sido questionada recentemente por comparações dos efeitos da aplicação de agulhas em pontos e não-pontos de acupuntura. Experimentos em ratos revelaram que a estimulação de pontos tradicionais causa uma maior expressão de genes induzidos por atividade neural em regiões do cérebro associadas a dor e atenção (Medeiros et al. (2003) Braz. J. Med. Biol. Res. 36:1673; Lao et al. (2004) Brain Res. 1020:18). O imageamento cerebral de humanos por tomografia de emissão de pósitrons (PET) também ilumina a questão. Biella e colaboradores (NeuroImage (2001) 14:60), comparando os efeitos da acupuntura com a aplicação de tratamento placebo, observaram que a acupuntura causa uma forte ativação em áreas cerebrais relacionadas à dor, conforme previsto pela "teoria dos portais" dos anos 60. O grupo de Pariente (NeuroImage (2005) 25: 1161) comparou acupuntura e placebo com o toque não perfurante de agulhas de madeira. O toque cutâneo causou ativação apenas das áreas cerebrais relacionadas ao tato, enquanto o tratamento placebo ativou também as áreas cerebrais relacionadas à recompensa e liberação de opióides. A acupuntura, além de todas estas áreas, ativou ainda o córtex insular, implicado na modulação da dor.

Em resumo, estes resultados sugerem a existência de um efeito específico dos pontos da acupuntura, para além da fé na eficácia das agulhas. Quando praticada em seus pontos tradicionais, a acupuntura parece ser capaz de perturbar o circuito nervoso responsável pela percepção consciente da dor, de forma a diminuir sua intensidade. Mas de que modo os rudes antepassados de Ötzi aprenderam a realizar esta sofisticada reprogramação neural? Provavelmente a terapia envolvia inicialmente apenas o efeito placebo, evoluindo depois, por tentativa e erro, para a aplicação nos pontos que melhor atenuam a dor. Grandes sábios tatuados do passado!
Sidarta Ribeiro é Ph.D. em neurobiologia pela Universidade Rockefeller e pesquisador do Instituto Internacional de Neurociências de Natal (IINN). Fez pós-doutorado na Universidade Duke (2000-2005) investigando as bases moleculares e celulares do sono e dos sonhos e o papel de ambos no aprendizado.