SIMBOLISMO DO CORPO


Simbolismos do Corpo

 

O Homem é arquetípico e a tradição sempre o comparou a um microcosmo. Percebendo-o desta forma, cada órgão, estrutura ou função do corpo reflete-se como manifestação de um dos arquétipos fundamentais. Se o separamos de seu modelo arquetípico, deixamo-lo de compreender em sua totalidade. A visão do corpo como símbolo sempre predominou nas antigas medicinas dos terapeutas-sacerdotes e encontramos esta referência na própria etimologia da palavra “Terapia”, que significa “o que torna a colocar em harmonia”. Harmonia que vem com a conjugação dos opostos e da re-unificação das polaridades na unidade funcional do Homem, ligando-o às suas esferas mais sagradas e superiores.

Simbologia

A raiz etimológica da palavra símbolo é Syn-bolein e significa “lançar junto”, “unir”. A união de duas partes, como a moeda quebrada que servia como garantia na comunicação na Grécia; é o elemento que une os dois mundos, o espiritual e o manifestado. Dia-bolein, em contrapartida, significa “lançar através”, “separar”, ou seja, tudo que aquilo que investe sua energia em separar os dois mundos. Os símbolos servem, então, como uma representação para a consciência para que esta se recorde e volte a buscar dentro de si tais reminiscências.

Vamos agora analisar algumas partes do corpo e seu simbolismo.

Simbolismo do pé

Nos pés temos as raízes do corpo – “na planta dos pés”-, por isso é comum designarmos alguém que tenha uma visão prática de vida como aquele que tem “os pés no chão”, ou seja, possui um justo senso de realidade e vivência. Então é pelos pés que temos a firmeza, a estabilidade e o enraizamento. Com eles temos a base de impulsão para todos os saltos na vida (grandes e pequenos) e para um progresso harmônico.

Simbolismo do joelho

Se os pés relacionam-se com o feto no ventre da mãe (início), o joelho, relaciona-se com o nascimento da criança. Na esfera interior, os pés é o ainda não realizado (semente) e os joelhos, ao realizado. (SOUZENELLE, 1984)

Ajoelhados, em atitude de oração temos uma atitude de recolhimento, voltando-se, simbolicamente, ao si-mesmo, à resignação e a renovação de votos. Em algumas tribos africanas, ter os joelhos fortes é demonstração de poder. Nestas tribos, o líder mostra o seu joelho para indicar que é ele quem porta o poder, pois é quem suporta o peso da tribo “levando-a nas costas”, mas com a sustentação dos fortes joelhos. Como contrapartida, problemas nos joelhos podem indicar orgulho.

Simbolismo da perna

Simboliza, de um lado, a força de crescimento da criança, “firmar-se em pé” e, do outro, a força de crescimento do Homem, desde o despertar interior até a sua coroação final, com a individuação ou o encontro com seu Ego Superior. Temos aqui a ideia do progresso contínuo, com o intuito de sempre dar um passo adiante e manter-se firme nos propósitos, sobre as próprias bases. Em uma longa caminhada, a constância no ritmo é mais importante que a chegada. As tartarugas caminham distâncias muito longas apesar de seus passos lentos.
Ter força nas pernas indica que a pessoa está apta a “caminhar com suas próprias pernas”, ou seja, desenvolveu um grau de individuação com ideias próprias que a permite não ser mais tomado pelo inconsciente coletivo.

A Coluna Vertebral

Do grego, a raiz etimológica de esqueleto, é skeleton, e encontramos a mesma raiz na palavra escola –skola- e também em escada - skada. As vértebras são os degraus de uma grande escada onde recebe e emite informações do mundo externo para o mundo interno e vice versa. São as informações que permitem o homem a crescer em todos os níveis de existência. A relação de escada, escalada, esqueleto e escola, com base na etimologia grega, parece fazer sentido quando observamos o espírito que permeava a educação à maneira clássica. A coluna possui a função de apoio, sustentação e, ao mesmo tempo, é dinâmica.
Ela é dinâmica e estática ao mesmo tempo. Funciona como eixo e também como amortecedor, pois entre as vértebras, há os discos intervertebrais. Sua natureza dinâmica e flexível lembra a natureza do bambu. A inflexibilidade psicológica pode causar rigidez na coluna, sendo a causa de algumas patologias nesta área do corpo.

Os ombros

Na mitologia grega, Atlas, filho de Gaia com Urano, pertencia à geração divina. Com outros titãs, forças do caos e da desordem, pretenderam alcançar o poder supremo, atacando o Olimpo e lutam contra Zeus e seus aliados - espírito da ordem e do cosmos. Triunfante, Zeus, castigou seus inimigos lançando-os ao Tártaro, a região mais profunda do Hades. Para Atlas, porém, reservou uma pena especial: sustentar nos ombros e para sempre o céu. Atlas, assim punido, passou a morar no país das Hespérides junto com as três ninfas do Poente: Eagle, Eritia, Hesperatetusa.

O mito de Atlas reflete bem como que no ombro carregamos o “peso da vida”. Na linguagem informal quando uma situação se complica, a expressão é que há mais "peso sobre os ombros". Simbolicamente, todo o ser humano é um Atlas que carrega o seu “céu interior”.


Os braços

É com a força do braço que as obras são efetuadas. Ele é o eixo horizontal da cruz, complementado pelas habilidades da mão. Ele é o que dá a “força de trabalho” e não por acaso nas greves utiliza-se o gesto dos "braços cruzados". O “braço direito" indica a pessoa de maior confiança, enquanto "não dar o braço a torcer" é sinal de resistência, não dar-se por vencido. Em todos os sentidos o braço nos transmite a ideia de força, trabalho, resistência, segurança e proteção.

As mãos

Funcionalmente a mão é a mais importante ferramenta do ser humano, pois com ela podemos dar, pegar, manipular, sentir, evitar, cumprimentar, tocar, curar, rezar, trabalhar, ferir e, por fim, matar. Com as mãos se faz história e cultura. Na linguagem informal temos uma série de expressões como “estender a mão", no sentido de oferecer ajuda ao próximo ; “controlar com mão de ferro", quando o governo é tirano ; “ser mão aberta ou fechada” ; etc. e todas estas expressões coloquiais guardam uma simbologia com a psique humana. 


O pescoço

No pescoço temos a ligação entre o superior e o inferior. Aqui forma-se o eixo e a base do superior, a cabeça. É onde, psicologicamente, ficam entaladas as palavras e as emoções e, por isso, problemas de tireóide podem ocorrer com pessoas com dificuldade de expressão emocional 
Nas costas do pescoço temos a nuca. Uma nuca rígida pode significar rigidez de caráter, como se esta imobilidade impedisse de olhar para cima, para os lados, para baixo ou girar a cabeça. É como se mentalmente e emocionalmente a cabeça (a psique) estivesse somente direcionada para um aspecto da realidade. Essa rigidez e limitação não é algo sadio. Porém, o perigo consiste também no outro extremo, onde a dispersão e um “falso ecletismo” podem predominar. Nestes casos, o pescoço quer olhar para todas as direções de forma descontrolada e sem foco, sem um centro e eixo governante. Mas quando a pessoa assume uma atitude aberta frente ao mundo, a todas as possibilidades que a vida oferece, há um centro que orienta e equilibra. Se a pessoa de fato estiver equilibrada, os contrários se complementam e o pescoço não apresentará rigidez. 

A cabeça

Neste tópico será visto a cabeça e a face, o que inclui o simbolismo do cabelo, da orelha, do olho, da boca, dentes e nariz.

A parte mais superior do corpo, a cabeça (capital), é considerada também a mais espiritual (DAHLKE, 1996). Todas as funções superiores encontram-se na cabeça, tais como memória, percepção, fala, psicomotricidade, dentre as inúmeras funções internas do ser humano. Por isso simboliza aquilo que temos mais Divino.

Na cabeça temos os cabelos como elemento simbólico a ser estudado. Eles simbolizam a força divina, sendo a estória bíblica de Sansão a que mais claramente expressa essa ideia. São como antenas ou agentes de captação da energia superior. Sem essa energia, o ser humano perde suas forças. 

É também na cabeça que temos um dos órgãos mais intrigantes do corpo humano: os olhos. Eles refletem os estados anímicos do individuo e podem expressar distanciamento ou proximidade: eles são espelhos ou janelas da alma. De fato, os olhos são como janelas para o mundo interior, pois sua extensão, através dos nervos ópticos, ligam o mundo externo diretamente ao cérebro, ao labirinto infinito da mente. São os olhos, através do globo ocular e seus canais nervosos. que une o infinito do universo com o infinito do ser humano.
As orelhas costumam representar o “saber escutar”. No ouvido interno, temos o labirinto, aquele que promove o equilíbrio para o corpo humano. Assim, silêncio, humildade e equilíbrio são virtudes essenciais para o crescimento interior.
A boca é a sede da palavra, órgão de entrada e saída e a primeira fonte de contato com o mundo externo (seio materno). Em uma das chaves simbólicas associa-se ao arquétipo feminino, à feminilidade, à nutrição, à criação e conservação.Na boca temos os dentes e por meio deles conhecemos a vitalidade e longevidade e o modo como esta pessoa cuida de si mesmo, pelos seus aspectos gerais. Em geral, uma pessoa com dentes mal tratados possui baixa autoestima ou um descuido inerte com relação aos cuidados básicos ao corpo. Como expressão de vitalidade temos conhecido ditado que “cavalo dado não se olha os dentes”, pois é possível conhecer a idade desse animal apenas observando o tamanho dos seus dentes.

Quando lidamos com símbolos muitas interpretações podem deles surgirem. E isso é o que realmente os caracterizam, pois conceitos fechados e reducionistas não fazem parte do universo dos símbolos. Assim, o leitor poderá encontrar interpretações distintas conforme a abordagem adotada, sendo que o importante é que cada um busque em si mesmo a relação com o órgão ao qual busca conhecer melhor, pois certamente o corpo tem muito a nos ensinar. 


Alberto Maury
Psicólogo e Diretor do Instituto Órion